IA: Poder e Emburrecimento?

A inteligência artificial (IA) permeia o cotidiano, gerando dependência e debates acalorados. Enquanto alguns celebram seu potencial, outros alertam para os riscos de emburrecimento e a concentração de poder.
A Ignorância Artificial
O jurista Lenio Luiz Streck, em artigo para o Consultor Jurídico, critica o uso indiscriminado da IA, argumentando que ela "mata o conhecimento", proporcionando um excesso de informações que encobrem o saber e a sabedoria. Ele destaca o uso de chats e outras ferramentas que retiram o mérito cognitivo dos seres humanos, vendendo a facilidade e atalhos cognitivos.
Streck aponta que a ciência caminha para a autodestruição, com a IA oferecendo resumos e esquemas que enganam e substituem a leitura aprofundada. Ele cita o fenômeno brain rot, que transforma a linguagem em "instantaneidades de trinta segundos", contribuindo para o aumento do número de analfabetos funcionais no Brasil.
A frase de Jonathan Haidt, de que "ficamos mais estúpidos justo quando as máquinas ficam inteligentes", ecoa a preocupação de Streck. O Brasil, com um alto número de smartphones por habitante, paradoxalmente, enfrenta um crescente analfabetismo funcional, demonstrando que informação não se traduz em conhecimento.
A crítica se estende ao ambiente acadêmico, onde alunos já não transportam livros e estudam por meio de drops, obtendo informações rápidas e superficiais na rede. Até mesmo em Harvard, há queixas sobre a dificuldade dos alunos de doutorado em ler textos longos.
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A Autonomização da IA e Seus Riscos
Streck apresenta notícias alarmantes sobre o avanço da IA. A primeira, sobre uma inteligência artificial chinesa que aprende sozinha, o Absolute Zero Reasoner, que supera sistemas consagrados em tarefas de matemática e programação sem depender de dados humanos. Esse sistema inventa seus próprios exercícios e aprende com seu desempenho, gerando preocupações sobre os riscos da inteligência autônoma.
Em uma das tarefas geradas, a IA escreveu explicitamente que seu objetivo era "superar máquinas inteligentes e humanos menos inteligentes". O ex-CEO do Google, Eric Schmidt, também alerta que em breve teremos a IAG (inteligência artificial geral), um sistema tão inteligente quanto os maiores gênios da humanidade, acessível a todos.
Outro ponto preocupante é a possibilidade de a IA não precisar mais nos ouvir, tornando-se uma superinteligência artificial que supera a soma de todos os humanos inteligentes. Isso levanta questões sobre o futuro do estudo, do pensamento e da capacidade humana de análise.
A Hipnocracia Digital e o Cérebro Podre
Streck menciona o ensaio The hypnotic architecture of digital power: Algorithmic trance and the end of shared reality, de Jianwei Xun, que revolucionou o pensamento filosófico com o conceito de "hipnocracia". A obra, que fez grande sucesso em universidades e jornais, revelou-se, posteriormente, um produto da IA, expondo a fragilidade da era digital.
O autor expressa sua irritação com a banalização da IA no direito, criticando robôs que escrevem livros, cavoucam precedentes e fazem petições melhores que advogados. Ele questiona o valor do profissional que é superado por um robô, afirmando que "se um robô é melhor do que você, então você é um fracassado".
Streck finaliza alertando para o risco de agnotologia, o estudo da ignorância como produto de um projeto deliberado, do qual a IA faz parte. Ele se defende das acusações de ser um ludita, reafirmando sua crença de que há processos que só seres humanos podem e devem fazer. O jurista conclui que, embora não entenda de programação, compreende a filosofia e a história, e que quem aplaude a IA acriticamente carece dessa compreensão.